A Amazônia e Maquiavel
por Luiz Mário de Melo e Silva
Coord. do Fórum em Defesa do Meio Ambiente de Icoaraci
(FDMAI)
luizmario_silva@yahoo.com.br
/ (91) 83636720
Icoaraci – Belém – Pará.
A História
não retroage muito menos a natureza e qualquer tentativa em congelar o fluxo de
ambas é, no mínimo, crime contra a humanidade em seu processo permanente de
evolução. Todavia, isso é tentado constantemente e Maquiavel é convocado para
tal tarefa, sobretudo pelos políticos, num claro ato de corrupção.
Quando da
produção de O Príncipe, obra que imortalizou Maquiavel, a Itália era um campo de batalhas entre iguais e seu autor
tinha a intenção de unificação – algo diametralmente oposto ao que intentam
contra a Amazônia, porque os tempos são outros e como diria o poeta “o tempo
não para”, e, por isso, Maquiavel, mais
que algo a explicar , é o complicador.
Se O
Príncipe é um tratado, um manual de política para a conquista e manutenção do
poder é imperioso pensar, então, que o poder, almejado pela razão, não deve ser
exercido por alguns poucos, porque razão e poder tendem a ser os mais elevados
potenciais humanos para a manutenção da convivência em sociedade e a razão para
tal exercício não deve ter distinções, sob pena de ser algo opressivo porque tende
negar a capacidade do pensamento critico para a existência da razão.
À época de
seu aparecimento e, sobretudo, pelas circunstâncias em que é elaborada, a obra
é mais que necessária, porque renascentista valoriza o ser humano com aquilo
que o liberta do obscurantismo da Idade Média, imposta pela Igreja Católica,
que é a razão que almeja o poder para a liberdade do ser humano.
Contudo, é
importante lembrar que no período renascentista a razão encontra respaldo na
incipiente ciência e tem nela uma fortíssima aliada para lutar contra o “poder
teocrático” da igreja – aliás, a aliança descambou em tutela da ciência, a qual,
hoje, parece ser tratada como instrumento para a manipulação da maioria, e com
isso, vindo a torná-la como um arremedo da inteligência (a pseudociência),
tendendo a incorrer no mesmo erro que envolve a razão.
No atual
contexto, o uso de Maquiavel evoca um passado que não mais retorna, e o que se
vê é “o futuro repetir o passado” (...) num “museu de grandes novidades”, como
diria o poeta Cazuza. E embora ainda encontre efeitos positivos o florentino
está em oposição ao fluxo citado anteriormente, valorizando a máxima de Karl
Marx, em que “a História se repete como farsa”.
Ora, isso
ocorre porque há a tentativa em manter intacto o status quo do combalido
capitalismo que passa por crises intermináveis e só sob trevas tende a se
manter inabalável, como ocorreu ao Império Romano às vésperas de sua derrocada,
bem como à Igreja Católica, cada qual à sua época, que são exemplos de oposição
ao processo de transformação, despendendo, para isso, de grande esforço
conservador. E claro que a manutenção – mais importante que a conquista - do
poder capitalista está na ordem do dia e é preferível a corrupção às
atrocidades da guerra (embora esta não esteja de toda descartada) que se
espraia aos quatro cantos do mundo, com a globalização.
E nada
melhor que a estratégia maquiavélica da corrupção para justificar o fim a que
se propõe que é manter o capitalismo. O que se dá por meio da educação
repetitiva, enfatizando um centro de controle, como impõem as carcomidas
culturas elitistas ocidental e oriental, que se pretendem eternas, muito embora
o empirismo, como base do referido trabalho, seja um dado fundamental para a
construção e manutenção de algo que se pretenda como real, o que não garante a eternidade.
No entanto,
isso se mostra, no mínimo, perigoso porque como nunca houve uma enorme
quantidade de determinada espécie como é a humana, caracterizada pela razão,
que não poderá ser impedida por muito tempo de utilizar esse potencial para sua
conservação, seu impedimento, em tal circunstância, poderá produzir monolíticos
monstros assassinos (um leviatã irracional, por exemplo). Além do que, já não
mais estaremos falando de ser humano em sua plenitude e, sim, de algo sem valor
(haja vista que este é gerado pela razão) que não merece respeito e
consideração; aliás, como vem ocorrendo em diversas situações mundo afora.
Alguém
poderia notar que a resistência dos amazônidas à construção da Usina
Hidrelétrica de Belo Monte (UHBM) poderia evocar um contexto quixotesco. Isso se
não houvesse a natureza exigindo sua fatura. E nada melhor de quem ou o quê
sempre manteve o elo entre “desenvolvimento” e “atraso” para opinar sobre tema
tão polêmico – mas inevitável – como são os índios. Ademais, a unificação
proposta por Maquiavel só é possível de ser entendida, atualmente, se observarmos
que na natureza ela sempre foi uma constante com o objetivo de garantir a vida
por meio da evolução que necessita de todos os elementos existentes, em
perfeita simbiose, tornando cada vez mais complexo (amplo) o que surge ao
contrário da proposta anterior que é manter estável (ou estático) o que
surgiria.
Portanto, o
que se apresentava como novidade, como ocorre ao conhecimento em seu surgimento,
tende a se tornar informações, às vezes irrelevantes, com o passar do tempo,
embora, ainda assim, possa ser usada como algo positivo por opressores espertalhões
contra incautos, obviamente desprovidos de razão crítica, para que estes não
percebam o quanto sofrem manipulações e assim, na ignorância, tentam garantir,
ad aeternum, a manutenção de uma ordem que se esvai, principalmente por não poder
se opor ao tempo concretamente percebido por meio da História e da natureza,
sobretudo esta como nova linguagem – aliás, refinada através da ciência, esta
que pode ser utilizada para o benefício ou malefício da humanidade, como usou
Maquiavel para iluminar o mundo no séc. XVI, e que, hoje, tende a servir para,
ao contrário, obscurecê-lo, via corrupção, para justificar a conservação de
algo insustentável como a sociedade capitalista/burguesa.
Algo contra o qual a Amazônia, em sua rica biodiversidade,
se apresenta e impõe como divisora de águas. Até porque, para haver Maquiavel é
necessário existir Alices, ou doutos Pangloss, que precisam ser superadas para
a evolução da humanidade.