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"Não é o bastante ver que um jardim é bonito sem ter que acreditar também que há fadas escondidas nele?"
(Douglas Adams, 1952-2001)

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quarta-feira, 23 de março de 2011

Poesia Amazônida


Natureza

Natureza vilipendiada

por Luiz Mário de Melo e Silva

A sociedade voltou seu olhar para a natureza, mas ele não é algo virtuoso. Antes, porém, parece conter considerável dose de desaprovação, por ela (natureza) obrigar a sociedade a perceber sua fragilidade ante o inelutável processo de evolução – sua lei fundamental. Ensejando, por isso também algo pavoroso sendo, portanto, um olhar revelador.  

Num primeiro momento, isso só foi possível devido ao esgotamento de muitas matérias-primas, além da certeza que ocorrerá o mesmo com muitas outras, que, utilizadas na confecção de bens de consumo, garantem destaque a quem os possui em enormes quantidades. Portanto, é pelo desaparecimento de recursos naturais que a sociedade, a contragosto, tende a valorizar a natureza, por  conduzir à perda, que, na sociedade capitalista, nada mais é que prejuízo econômico –  o grande desastre da civilização.

Mas tal valorização encontra certas dificuldades, porque, ao imaginar-se como que apartado da natureza, e, portanto, pretendendo-se superior a ela, o homem, vindo a se organizar em sociedade, criou “leis”, como o consumismo, por exemplo, que atualmente é o padrão a modelar a conduta ética e moral da sociedade, conferindo status político/econômico/social a seus membros por desfrutarem da citada condição - coisa que a imensa maioria não está disposta a abrir mão em detrimento da natureza, mesmo que isso configure risco à sua existência.

Em momento seguinte, e talvez seja o que importa verdadeiramente, as catástrofes observadas mundo afora é o que reforça esse redirecionamento da atenção, pois é mais do que óbvio que elas são sempre humanas e não da natureza que manterá seu curso ad aeternum “sem se importar” com as transformações havidas. Aliás, são estas que definem o que seja natureza, cabendo aos elementos constituintes participarem ativamente do processo. É claro que para o ser pensante e sensível essa condição se assemelhe a uma prisão, coisa facilmente dissipada se atentar para a dinâmica a que está envolvido desde o nascimento.   

Ainda que a relutância em reconhecer a imprescindível importância da natureza para sua existência esteja condicionada por um valor moral que a sociedade, em cada época, reputa como absoluto (o consumismo atualmente, por exemplo), a mesma não pode evitar a natural dinâmica evolutiva impressa, sobretudo, em seu interior, haja vista que esta foi e continuará sendo o que a impele a continuar existindo. Dinâmica, que, aliás, é inerente ao ser advindo da própria natureza, como é o indivíduo, por exemplo, núcleo atômico da sociedade, logo, transformador de si concomitante ao ambiente em que se encontra.

Por que, então, a insistência em manter algo que não escapa à  força da natureza? Porque, ao se pretender diferente dela, o homem, agora em sociedade, se pretende também diferente da maioria. E para tentar preservar-se como tal, determina uma condição a ser ocupada por se julgar superior, pretendendo-se insubstituível, estabelecendo,  então, a ideia de elite.

Mas é um equivoco imaginar-se como que apartado da natureza, ocorrendo o mesmo ao se observar a sociedade com distinção de classes, onde um grupo tende a ser preponderante com sua existência se devendo ao uso da força - ainda que para defender tal distinção haja o argumento da presença de indivíduos superiores devido ao intelecto, ou gênio, algo refutável, haja vista que o intelecto, ou genialidade, se desenvolve na relação em sociedade muitas vezes sob conflitos e não fora dela, comprovando a dependência do indivíduo em relação à coletividade.

Contudo, o mal-entendido que prevalece por algum tempo, tornando-se quase imperceptível para a maioria, chega a um limite insistentemente contornado pela coerção exercida por instituições estabelecidas para garantir o status quo vigente, provocando um acúmulo de conflitos que tende a impedir a percepção da natureza enquanto referência para a humanidade lidar com as dificuldades surgidas ao longo de sua existência.

Ora, nestas condições a negação da natureza levou, então, ao extremo de se pensar não mais a sociedade dada como algo diferenciado da humanidade - o que é saudável -, ainda que para isto seja necessário rever os conceitos impostos como verdades absolutas, pois só assim o conceito de humanidade, no sentido de totalidade do entendimento real de tudo o que é possível e imaginável possa ser atingido em sua plenitude sempre dinâmica. Coisa negada por pensadores vigorosos, como Kant, por exemplo, que sugere que “o filósofo já nasce pronto, acabado”. Noção copiada e seguida por muitos pensadores a serviço da falsificação do entendimento do que seja a natureza, ainda que “involuntariamente”. O que em si adquire a negação da dinâmica natural contida na matéria, no tempo, no espaço etc., isto que se revela como o mais plausível para o entendimento da dinâmica das relações humanas e desta com o meio natural, mas que não pode ser assimilado pelo povo enquanto processo de libertação – pensamento que está mais para a fomentação da fragmentação, do reducionismo do ser humano, logo, da natureza, daí que é algo pensado, calculado, para o domínio desta e, consequentemente, da humanidade.

Daí que, a prática humana, através da transformação do meio e, consequentemente, de si mesma, no processo das relações sociais, como ensinou Karl Marx, tende a ser a linguagem mais plausível do que seja a natureza e esta, mais do que nunca, não pode estar sob o controle de um centro, de um pequeno grupo, que sempre a vilipendiou e, com isso, usurpou sua condição de referência de manutenção da vida. 

E as tragédias, as falências econômicas (sempre humanas) demonstram os limites dos referenciais impostos, assim como foi com o Império Romano, a Santa Igreja Católica Apostólica Romana e, hoje, o Capitalismo que vive seu estertor, ainda que sob uma tentativa de abafamento desta condição por seus acólitos que ingenuamente imaginam serem destaque, com suas vaga, num corpo moribundo, como o mercado. Contando, assim, com sua idiotização. Por isso a desaprovação e o pavor revelador da sociedade capitalista  - óbvio.

Autor: Luiz Mário de Melo e Silva 
luizmario_silva@yahoo.com.br // 92343620
Coord. do Fórum em Defesa do Meio Ambiente de Icoraci (FDMAI)
Icoaraci – Belém – Pará